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Aos dez anos já Eduardo sabia o que queria ser quando fosse grande. Queria ser médico e a sua escolha estava fundamentada. O médico, por um lado tinha um conhecimento vasto e científico, o que o atraía e fascinava, e por outro lado utilizava o seu conhecimento para ajudar pessoas, para salvar vidas, o que lhe dava a perspectiva de plena satisfação pessoal.


Aos onze anos já Eduardo entendera que ser médico significaria ser escravo da sua profissão, pois não seria capaz de se negar a ninguém que dele necessitasse. Escolheu então um outro caminho: ser engenheiro. Esperou que tivesse um nível equivalente de conhecimento científico. Já sabia que não teria o envolvimento humano do médico, não ajudaria directamente ninguém, não salvaria vidas. Mas poderia ter uma vida mais sua, mais livre.


E como seria se não conseguisse? E se os seus pais não tivessem como pagar-lhe o curso? Que escolhas lhe restariam?


Conseguiu. E começou a trabalhar. Ao fim de alguns anos tinha já um bom estatuto, com um bom rendimento.


 


Aos trinta e poucos anos começou a sentir a falta do lado humano, de mexer com pessoas, de tentar minorar sofrimentos. Desejou aprender coisas novas, criar, inovar, mas para aliviar as angústias e os medos dos outros.


Com mais alguns anos vividos entendeu que as pessoas eram a matéria que queria, de facto, trabalhar. Porque não percebeu isso mais cedo? Há um tempo para tudo e tudo necessita de ser amadurecido. Queria abandonar os números, as máquinas, os loucos objectivos, o efémero comercial, a falsidade dos sucessos, a mentira das excelências, o artificial do espectáculo encenado para vender um pouco mais, a qualquer preço. Queria dedicar-se às pessoas, às suas necessidades básicas: emoções, afectos, sentimentos, saúde, dignidade, relacionamento, integração.


Mas, como fazer para mudar de vida? Como perder estatuto, como perder rendimento? Como pagar as contas? Como cuidar da família? Como assegurar o futuro dos filhos?


Foi então que Eduardo percebeu que não tinha escolha. O passado definira e condicionara o seu futuro. Eduardo percebeu que se tornara, voluntariamente, num refém. Num refém em busca de liberdade.


 


FCC


 

Link deste ArtigoPor Mil Razões..., às 00:05  Comentar

De Cidália Carvalho a 13 de Abril de 2010 às 21:10
De uma maneira ou de outra - por compromisso, dever, obrigação , missão - todos somos reféns das nossa escolhas. A diferença, penso, está no facto de umas serem as escolhas certas e feitas no tempo certo.
"Mexer" com pessoas, minorar os seus sofrimentos, ajudá-las a dignificarem-se, etc , não é exclusivo de uma profissão como a medicina ou a psicologia, podemos fazer isso no nosso dia a dia, no emprego, em casa, no supermercado, na rua, sempre e em toda a parte.

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