30.7.10

 

O esforço para acompanhar as passadas largas e apressadas da mãe, na rua íngreme e de passeios tortuosos, é grande. Ainda assim é por aquela rua que, todos os dias, quer ir para a escola. Desde que abriu aquela pastelaria que alimenta a expectativa de um dia vir a ter uma daquelas caixinhas que graciosamente enfeitam a montra. Não sabe o que elas guardam mas tem muita curiosidade em saber.
À medida que se aproximam, abranda o passo e com um olhar guloso viaja pela montra. Os bolos, frescos e expostos de forma a chamar a atenção dos que passam, são tentadores. Mas é nas caixinhas coloridas que os seus olhitos se fixam. Arrumadas em grupos, num jogo de formas coloridas, ficam muito atractivas. Quadradas ou rectangulares, forradas com papel celofane rosa com fitinhas verdes, em papel cor de laranja com laçarotes amarelos, ou nos vários tons de castanho e pérola, todas elas ficam muito bonitas.
Não sabe de qual gosta mais e se pudesse escolher uma não conseguiria decidir-se. Outras ainda, do mesmo tamanho mas em forma de coração, sendo diferentes são igualmente bonitas e muito misteriosas. O que esconderiam aquelas caixinhas com laçarotes tão bonitos? Chocolates aveludados com recheio de natas? Caramelos cremosos? Gomas coloridas? O que quer que fosse, só podia ser muito bom, aquelas caixinhas não a enganavam!
Aproxima-se mais e cola a carita ao vidro, tenta apanhar um aroma ou algo que a ajude a descobrir que segredos encerram.
Não sabe explicar como isso acontece mas quanto mais as admira, mais adocicado é o gosto na sua boca, e só desaparece com a pressão de uma mão a lembrar-lhe que estão a caminho da escola.
Um dia vai ter uma caixinha daquelas!
 
O fim de ano escolar chegou e com ele a confirmação dos bons resultados. Merecia ser recompensada. Para surpresa de todos pediu uma caixinha das que estão na montra da pastelaria no cimo da rua, nenhuma em particular, qualquer uma a tornaria muito feliz. Com estranheza, a mãe entregou-lhe a caixinha.
Pegou-lhe com muito cuidado. Primeiro tomou-lhe o peso, pareceu-lhe muito levezinha, que guloseima poderá ter esta leveza? Abanou-a; não sentiu nada lá dentro. Tirou o papel com muito cuidado, não quis amachucá-lo. Finalmente a caixinha ia deixar de ter segredos. Tirou a tampa. Não quis acreditar no que os seus olhos viam - melhor dizendo não viam. Dentro, a caixinha não tinha nada. Vazia! Esqueceu-se dela em cima da mesa.
O tempo manteve-a como objecto decorativo.
 

Cidália Carvalho

 

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