28.9.10

 

- Mãe, conta-me outra vez a tua história e do pai.
E eu contei, pela enésima vez, como eu e o teu pai nos conhecemos. Falei-te da magia que ambos sentimos quando os nossos olhares se cruzaram. Das juras de amor eterno, do casamento, da felicidade que nos invadiu por acreditarmos ser almas gémeas. Contei-te o quanto te desejamos, todos os planos que fizemos contigo e a tremenda alegria que sentimos quando te apertamos nos braços pela primeira vez. Mudaste as nossas vidas para sempre.
Durante os nove anos seguintes vivemos em estado de graça. É incrível o quão apaixonados nos sentimos, todos os dias mais um bocadinho, por um filho! Disse-te que te amava assim, com um amor que foi crescendo dia após dia, até já não caber dentro de mim.
 
Desta vez, já não contei a história até ao fim. Tu, já não a ouvias. Senti a tua mão soltar-se da minha devagarinho e os traços do teu rosto suavizarem-se, como se tivesses adormecido. Respiraste pela última vez. Eu também.
Não sei durante quanto tempo chorei depois da tua morte. Toda a gente pensou que chorava apenas por te perder de uma forma tão vil mas, na verdade, também chorava pela culpa que me atormentava. Senti-me aliviada quando partiste. Já não suportava ver-te sofrer, dia após dia, durante tanto tempo. Não suportava os teus gritos de dor quando já nada te aliviava. Consegues perdoar-me, filho? Eu ainda não me perdoei a mim própria…
Não compreendo muitos dos meus sentimentos, apenas descodifico o amor que sinto por ti…Passaram-se três anos, dizem. Não sei… O meu tempo parou quando partiste e ainda não acordei desta letargia que se abateu sobre mim.
Hoje estou aqui, ao pé da tua campa. O teu pai fez questão de a escolher; foi a última coisa que fez antes de partir. Estive muito tempo sem cá vir mas hoje saí de casa. Vim ver-te. Vim contar-te de novo a nossa história. Sei o quanto gostas de a ouvir. Dizias que os meninos deviam ser todos especiais e nascerem de histórias preciosas, como a tua. Tinhas razão, filho…
 
O teu pai já cá não está para a contar comigo. Não suportou a tua ausência e perdeu-se nele próprio, tal como eu. No entanto, descubro hoje que há amores que resistem à ferocidade do tempo e às intempéries da alma, e que se prolongam para lá da vida.
Já não te posso abraçar, nem ouvir a tua voz, mas continuas a viver dentro de mim. Aí, nunca morrerás, nunca sofrerás. Serei sempre a tua mãe, serás sempre o meu querido filho.
Sempre. Para sempre.
 
Alexandra Vaz

 

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