Foto: The Man Face In The Hands – George Hodan
Consciente ou inconscientemente, cada um de nós carrega em si mesmo uma multiplicidade de “eus”, seja por força das circunstâncias, das experiências, das pessoas, ou de nós mesmos. Diferentes pessoas arrancam diferentes eus de nós mesmos: há aqueles que conseguem tirar de nós a mais amável das pessoas e outros que despertam o espírito mais malévolo que habita dentro de nós. Tão depressa podemos estar a dançar e cantar, soltando a veia artística que corre em nós, como, em questão de minutos, podemos estar retrospetivos e circunscritos dentro do nosso próprio mundo, qual caranguejo dentro da carapaça. Somos moldes de nós mesmos.
Todos os dias, cada ser humano se adapta a novas situações, circunstâncias, desafios… Mudamos de papel na mesma medida que a nossa vida muda de cenário, rumo ou direção. Se olharmos para dentro de nós, descobriremos uma incalculável e inesperada variedade de “eus”. Talvez por isso admiremos tanto Fernando Pessoa, não só pelas suas obras literárias, mas especialmente pela descrição deslumbrante dos seus múltiplos “eus”.
Ao longo da vida, ao longo de um dia, de uma hora, às vezes em questão de segundos, assumimos múltiplas facetas, personalidades, papéis, ainda que nem sempre tenhamos consciência de tal. A nossa (in)consciência acaba por criar e determinar o papel da personagem que seremos a seguir, provavelmente diferente do que fomos ontem, do que somos agora mesmo, neste instante.
Sendo e vivendo nesta multiplicidade, ainda que não em plena consciência, vamos sendo isto, mas também o seu contrário, seres antagónicos, a voz de inúmeras contradições, olhares paradoxos…
A multiplicidade é a expansão de nós mesmos, uma forma de nos conhecermos melhor, descobrindo em igual medida os nossos limites. É a incessante descoberta de “eus” que nunca acabam e que vão acontecendo na vida.
Sandra Sousa