Foto: Dance – Public Domain Pictures
Pensando em todas as cenas de amor que tive o privilégio de vivenciar e presenciar até aos dias de hoje, lembrei-me que uma coisa que sempre me comoveu foi ver a adoração do meu marido pela Mãe, os seus olhos cor de oceano como que se liquefaziam de deslumbre ao olhá-la; “Minha riqueza”, chamava-lhe. Muitas vezes pensei que se um dia um filho me olhasse assim com tamanha ternura e desvelo, nada me faltaria.
Na verdade, não existe amor mais exaltado do que o amor de Mãe. Às vezes em exagero, convenhamos. Diariamente, nas redes sociais vemos verdadeiras declarações de mulheres que dizem que ser Mãe é a melhor profissão do mundo, de filhos que fazem verdadeiras declarações à Mãe, não faltam blogues e sítios da “especialidade” e coachs, todos a quererem ajudar, a opinar, a criar teorias e estratagemas para que nada falte às crianças, e que ainda assim, a mãe consiga arranjar um “tempinho” para si... Esqueçam. Deixem que vos diga: ser Mãe é muito difícil e por vezes uma tarefa muito ingrata. Não muito raro, digo “não” ao meu filho, questionando-me se afinal não poderia ceder. Ser Mãe faz-me questionar a toda a hora se estou a fazer o que realmente é melhor para o meu filho, ou então, faz-me cobrar a mim própria que deveria fazer melhor. Ser Mãe também é ingrato, porque às vezes gostava de não ter que ser tão “generala” e ser apenas amiga do meu filho, gostava de agarrar nele e dançar à chuva. É uma dúvida constante entre o que se fez e o que deveria ter-se feito.
No entanto, creio que o meu filho, de certa forma, me aquietou o coração durante a minha festa de aniversário quando, quase no final, me arrastou para a pista de dança e foi a correr segredar qualquer coisa ao DJ. “Mamã, pedi esta música para ta dedicar; aceitas dançar comigo?”. E eis que começa aquela kizomba mais que conhecida “Essa miúda é linda”. Então, aquele pequeno ser de 9 anos, que só pensa em Legos e futebol, olhou-me com aquele olhar azul cristalino. “Amo-te Mamã! Eu pedi esta música ao senhor porque para mim és a miúda mais linda do mundo!”, e foi então que vi aquele olhar que me era tão familiar, só que ainda mais especial, porque este olhar era para mim!! Como que a dizer-me que não está a correr mal esta coisa de ser Mãe. E o meu cálice transbordou.
Se pensar bem, de uma forma geral, há vários tipos de amor, que vão entrando e saindo da nossa vida sem nunca perderem o valor da eternidade, que inevitavelmente nos definem como pessoa e, como tal, também o amor que fui vivendo pela vida fora, o amor pela minha família, pelos meus amigos, por todas as coisas de que gosto verdadeiramente e mesmo o meu sempre-em-construção amor-próprio me definem. E eu nada seria se me faltasse um destes alicerces. Mas aquele amor que realmente me move é sem dúvida o amor que tenho pelo meu filho, porque a minha família ama-me da maneira que sou, tal como os meus amigos e portanto posso ser eu própria e, mesmo cometendo erros, sou absolvida porque me amam. Já para o meu filho tenho que ser exemplo, tenho que viver naquele exercício de equilíbrio entre ser educadora e compincha, tenho que dar o máximo de mim e, sobretudo, continuar a ser aquela miúda linda, para receber o olhar que me impulsiona para a frente, no sentido da vida. E um dia hei de dizer-lhe: “Aceitas dançar comigo à chuva?”.
Ana Bessa Martins