Foto: Monkey Training for a Circus - Yongzhi Chu
Há poucos dias vi numa revista as fotos vencedoras do World Press Photo. Entre várias, deparei-me com uma que me perturbou à primeira vista por ser, para mim, o retrato do medo, do pavor.
A expressão na cara do macaco é perturbadora, porque vemos o medo estampado na face e porque o vemos indefeso, encurralado, atado, sem poder fugir. A sua expressão assustada parece pedir clemência, parece dizer “Por favor, não!”.
O tratador aproxima-se dele, armado com uma corda, em posição de quem o vai castigar sem piedade. O tratador que acorrenta o pescoço do macaco ao pescoço da bicicleta, que prende o corpo do macaco ao corpo da bicicleta com o objetivo de tornar os dois um corpo só, para exibir em sintonia, no circo.
Não se vê a cara do tratador. É alguém grande, maior, poderoso, que usa uma arma para infligir o medo. A cara do macaco está claramente visível. Alguém pequeno, mais pequeno, fraco, indefeso, preso e amedrontado. O tratador é desconhecido, o macaco somos todos nós. Esta expressão é universal, humana ou animal. Perante algo que nos assusta é assim que reagimos, vê-se na cara, no corpo, não há como esconder.
Por isso mesmo o medo é uma arma poderosíssima – quem sabe usá-la, usa-a sem piedade e quanto mais medo vê no outro, mais poderoso fica; quem é vítima não consegue ocultar, fica encurralado, encolhido, preso e frágil. Pelo menos enquanto não se conseguir soltar.
O macaco já está solto, pois, felizmente, criaram-se alternativas ao circo com animais. Mas será que algum dia vai soltar o medo da sua memória?
Patrícia Leitão