Numa entrevista de trabalho:
“No registo que a empresa de Recursos Humanos me enviou, indica “disponibilidade condicionada”. O que significa isto?”
“Bom, desconheço os motivos concretos que levaram a entrevistadora a escrever isso, mas o facto é que eu tenho disponibilidade para trabalhar para a sua empresa dentro de um horário normal de trabalho, sabendo que, no final do dia, quero ir para casa, abraçar os meus filhos, ajudar nos trabalhos de casa, preparar-lhes uma bela torradinha, falar sobre como correu o dia, brincar… No fundo, a minha disponibilidade está condicionada por aquilo que considero o natural equilíbrio das coisas: o trabalho é importante, mas a vida pessoal também o é, e para mim, a família é um valor importante…”
A entrevistadora manteve um silêncio sorridente, que interrompeu numa declaração suspirada:
“Pois, mas o mercado de trabalho atual não se compadece com essas coisas. Eu própria, ao ouvi-la falar assim, olho para trás, e vejo que perdi muitos desses momentos de convívio e partilha com os meus filhos… eles agora já são grandes. E o tempo não volta atrás.”
O tom de voz muda quando contínua: “Bom, mas de facto admiro-a por ter a coragem de assumir essa posição. Aqui na empresa, é importante que os colaboradores tenham consciência de que há horas para entrar mas não há para sair. Mas desejo-lhe muita sorte e que essa sua posição nunca a prejudique.”
A reunião termina com a troca de mais algumas palavras e com um aperto de mão.
A entrevistada sai apressada, não querendo perder mais do seu tempo ali.
E sorri, por dentro e por fora. Sorri, porque sabe que, um dia, ao olhar para trás, nunca vai ter aquele olhar vazio e triste quando pensar nos empregos que podia ter tido se tivesse abdicado dos seus valores.
O seu olhar será feliz, brilhante, repleto de recordações maravilhosas, que não deixou de viver, em troca de trabalho escravo (ou, se preferirem, em troca do atual mercado de trabalho).
Sandrapep